O Amor Talvez Quem sabe Um dia Por uma alameda Do zoológico Ela também chegará Ela que também Amava os animais Entrará sorridente Assim como está Na foto sobre a mesa Ela é tão bonita Ela é tão bonita Que na certa Eles a ressuscitarão O século trinta vencerá O coração destroçado já Pelas mesquinharias Agora vamos alcançar Tudo o que não Podemos amar na vida Com o estrelar Das noites inumeráveis Ressuscita-me Ainda Que mais não seja Porque sou poeta E ansiava o futuro |
Ressuscita-me Lutando Contra as misérias Do cotidiano Ressuscita-me por isso Ressuscita-me Quero acabar de viver O que me cabe Minha vida Para que não mais Existam amores servis Ressuscita-me Para que ninguém mais Tenha de sacrificar-se Por uma casa Um buraco Ressuscita-me Para que a partir de hoje A partir de hoje A família se transforme E o pai Seja pelo menos O Universo E a mãe Seja no mínimo A Terra A Terra A Terra |
Música de Caetano Veloso na voz de Gal Costa, inspirada por poema de Wladimir Maiacovski parte da peça teatral "O Percevejo".
Um poema que representa a obra e os significados histórico e literário de Wladimir Maiakovski.Porém, como a tradução de qualquer documento interpreta seu significado, selecionamos um trecho de obra traduzida e encenada, que ousou realizar alguns dos princípios político-artísticos do autor: a proximidade com o público,a interação com este, a urgência dos temas, a esperança nas realizações objetivas e subjetivas da humanidade.
A peça O percevejo — escrita em 1928, representa de forma satírica as contradições políticas que caracterizavam a Revolução russa.
Na obra, a linguagem militante de Maiakóvski abandona o louvor à Revolução e adota uma ácida e pertinente crítica ao regime que se instalava sob o comando de Josef Stalin, o poema "o Amor" é antes de tudo uma tese sob a condição humana, oprimida pelos descaminhos da política soviética.
Ernesto "Che" Guevara certa vez disse que "o revolucionário é movido por sentimentos de amor". Essa premissa é explorada em toda a sua complexidade na poesia de Maiacovski, interpretada por Gal Costa.
A música foi parte da montagem encenada no Brasil em 1981 sob a direção de Luís Antônio Martinez Corrêa, ícone da dramaturgia brasileira. Neste momento histórico, a crítica ao autoritarismo era uma necessidade da produção artística brasileira, a estética modernista encontrara mais um terreno fértil.
Problematização do conteúdo
Maicovski era contrário ao "stalinismo" porque era contrário ao "czarismo". Essa idéia faz muito sentido hoje, mas custou-lhe a vida na Rússia de 1930.
O poeta russo viveu o mais complexo processo histórico de seu tempo, a Revolução de 1917, sua biografia se confunde com a própria história da Rússia, viveu-a de forma apaixonada, adentrando todas as portas que se abriam, experimentando um novo mundo que se queria criar.
Morreu "suicidado" pela decepção, pela degeneração autocrática, pelo autoritarismo que contrariava a essência da sua causa . A revolução, ou a deturpação desta, criara um monstro que também o engolira.
Ressuscita no amor pelos "bons combates", na luta por justiça, na dignidade do sonho, na coragem da crítica, no humanismo verdadeiramente revolucionário.
A beleza, da revolução e do amor, é entendida como o alimento de uma suposta utopia, que ressuscitará cedo ou tarde tornando-se real. A esperança na superação da miséria e de todas as formas de opressão existe, portanto, de uma forma quase religiosa, baseia-se numa profunda fé no ser humano, mesmo que este viva em zoológicos sociais...